Entenda a importância da inclusão de aluno autista em fase escolar e qual é a maneira mais adequada de realizá-la
A falta de inclusão adequada para alunos dentro do espectro autista ainda é uma realidade nas escolas brasileiras, isso porque as estratégias de inclusão do autista na escola nem sempre são exploradas. Para que essa situação possa mudar gradualmente, buscando uma inclusão adequada aos alunos autistas, é necessário entender uma série de fatores, tanto legislativos, quanto de formação dos professores que atuam nas escolas, garantindo, assim, uma análise adequada do que deve ser feito para garantir a inclusão apropriada destes alunos no ambiente escolar.
A Inclusão e a Educação como Direitos do Cidadão com Deficiência
Você sabia que a inclusão adequada de pessoas com deficiência e o acesso à educação é garantido por lei na Constituição Brasileira? No dia 6 de julho de 2015, foi instituída a Lei Nº 13.146, conhecida como Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, ou ainda como Estatuto da Pessoa com Deficiência, e tem como objetivo, segundo a legislação: “assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania.” Além desta lei, o ingresso de uma criança com autismo em escola regular é um direito garantido no capítulo V da Lei de Diretrizes da Educação Nacional – LDB, responsável por tratar sobre Educação Especial.
A Lei Nº 13.146 se baseia na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, sancionados pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 186, de 9 de julho de 2008. Ou seja, é possível perceber que as decisões relacionadas a leis, estatutos e protocolos ratificados pelo Estado em relação às pessoas com deficiência são ainda muito recentes no Brasil, o que começa a explicar o porquê de questões como essa, de estratégias adequadas para inclusão de alunos com deficiência nas escolas, ainda precisarem ser amplamente discutidas dessa maneira.
A Lei Nº 13.146 ainda explica no capítulo IV – “Do Direito À Educação” – como funciona a garantia do acesso à educação para pessoas com deficiência. Lê-se:
“Art. 27. A educação constitui direito da pessoa com deficiência, assegurados sistema educacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao longo de toda a vida, de forma a alcançar o máximo desenvolvimento possível de seus talentos e habilidades físicas, sensoriais, intelectuais e sociais, segundo suas características, interesses e necessidades de aprendizagem.
Parágrafo único. É dever do Estado, da família, da comunidade escolar e da sociedade assegurar educação de qualidade à pessoa com deficiência, colocando-a a salvo de toda forma de violência, negligência e discriminação.”
Quanto ao que é assegurado neste trecho, dois aspectos importantes devem ser destacados: a garantia de um “sistema educacional inclusivo em todos os níveis de aprendizado ao longo de toda a vida”, uma vez que os cursos de licenciatura, mesmo em universidades brasileiras renomadas, dificilmente tem a carga horária adequada em sua grade para disciplinas que abordem questões como a inclusão adequada de alunos com deficiência; e a igualdade de responsabilidade colocada sobre o Estado, a família da pessoa com deficiência, a comunidade escolar e a sociedade, ou seja, dentro da legislação não há hierarquia de quem é mais ou menos responsável pela garantia desse direito, uma vez que é um dever conjunto, que somente pode funcionar bem quando executado com esforço de todas as partes envolvidas.
Esses dois aspectos nos levam a analisar e refletir sobre duas questões relevantes na realidade brasileira atual: a formação de professores e a importância do diálogo entre escola e família.
A formação dos professores no Brasil
A formação dos professores no Brasil precisa ser levada em consideração quando o assunto é inclusão de alunos com autismo em idade escolar, uma vez que esses são os profissionais que passam metade do dia – ou mais – com esses alunos. Dentre os professores que estarão em constante contato com os alunos, somente os formados em pedagogia é que possuem maior preparo para lidar com alunos dentro do espectro, pois o curso de pedagogia possui diversas disciplinas dentro de sua grade que abordam temas como inclusão e estratégias que podem ser adotadas, porém, profissionais formados em pedagogia são aqueles que lecionam somente até o final do ensino fundamental I, até o fim do 5º ano da educação básica. Por essa razão, embora ainda existam problemas de inclusão nos anos iniciais da educação, esses costumam ser mais raros, uma vez que questões como a inclusão são mais tratadas dentro da formação acadêmica do profissional atuante.
A partir do ensino fundamental II, os professores que passam a atuar dentro de sala de aula são aqueles formados em cursos de licenciatura dentro de áreas específicas do conhecimento. Por exemplo, para as aulas de português e inglês, passa a ser um professor formado em letras, para as aulas de ciências, um professor formado em biologia, e assim por diante. O problema existente na inclusão de alunos do ensino fundamental II até o fim do ensino médio passa a ser evidente quando analisa-se a grade horária universitária de cursos de licenciatura, pois mesmo nas melhores universidades brasileiras, as aulas desses cursos de graduação voltadas à escolarização, focam quase sempre em questões mais superficiais, deixando o aprofundamento e as disciplinas sobre inclusão como matérias eletivas. Ou seja, matérias que podem ser cursadas pelo aluno, caso haja interesse de sua parte, mas que não são obrigatórias para a obtenção do diploma e do título de professor.
Por conta disso, em casos de alunos com autismo, percebe-se ainda nos dias atuais, muitas vezes, a presença de um professor formado em pedagogia dentro da sala de aula de turmas do ensino fundamental II, como tentativa de estratégia de inclusão por parte da escola, porém esse profissional costuma atuar de maneira exclusiva e individual com o adolescente com autismo, o que acaba por afastá-lo ainda mais dos colegas, impedindo um processo de inclusão e socialização adequado. Portanto, é necessário entender e buscar estratégias efetivamente inclusivas para a socialização destes estudantes nas escolas regulares.
A importância do diálogo entre escola e família
Como visto anteriormente, a própria constituição brasileira coloca a escola e a família como igualmente responsáveis por garantir uma inclusão adequada para as pessoas com deficiência. Tendo isso em vista e levando diversos outros aspectos em consideração, como os laços familiares e o potencial educativo da escola, percebe-se que, de fato, a inclusão adequada para alunos com deficiência só pode ser garantida com a atuação de ambas as partes.
O envolvimento da família no processo de escolarização de uma criança com deficiência ou, neste caso, de uma criança dentro do espectro, é essencial, pois se inicia na própria escolha de instituição educacional. Além disso, o envolvimento familiar continua durante toda a vida escolar do aluno, pois a instituição precisa estar constantemente atualizada sobre os acontecimentos da vida pessoal desse aluno, dado que eles influenciam seus comportamentos e reações em todas as outras esferas – inclusive na educacional.
A escola, por sua vez, tem a responsabilidade de ter profissionais preparados para a inserção adequada deste aluno nas diversas atividades escolares, para que a inclusão possa ser garantida de maneira efetiva e confortável. A escola também deve sempre buscar promover o diálogo com a família e estar de portas abertas para ouvi-la sobre suas experiências prévias e expectativas para o futuro, procurando garantir, assim, que todo o processo e envolvimento escolar do aluno seja agradável tanto para os familiares, quanto para a criança ou adolescente.
Como garantir uma inclusão adequada? A importância da rotina, dos trabalhos em grupo e da atenção ao hiperfoco
Levando em consideração tudo o que foi dito até agora, fica fácil perceber que para uma escola ser inclusiva, não é suficiente que haja um profissional especificamente designado para trabalhar com uma criança ou adolescente autista de maneira individual. Isso porque abordagens como essa acabam separando mais ainda o aluno de seus colegas, uma vez que não promovem, por exemplo, o trabalho em grupo de forma a incentivar a socialização entre alunos com autismo e alunos neurotípicos, sem que haja essa diferenciação.
Para que a inclusão de alunos com autismo seja adequada no contexto escolar é necessário primeiro que haja um bom diálogo entre a família do estudante e o corpo docente. Quando existe um bom relacionamento e diálogo entre as partes envolvidas, o restante se torna mais fácil, uma vez que as expectativas são alinhadas e todos trabalham em conjunto.
A rotina é algo essencial para pessoas com autismo, então tanto a rotina da família, quanto a rotina escolar devem ser bem explicadas para o aluno, para que, aos poucos, ele possa assimilar a ordem dos acontecimentos e se acostumar com essa sequência – previsível dentro do contexto da escola, sabendo que uma grade horária é montada e mantida pelo semestre ou pelo ano inteiro. Quando houver qualquer alteração na rotina escolar já conhecida pelo aluno com autismo, seja a ausência de um professor em determinado dia, ou a troca da ordem das aulas, é muito importante que essa mudança seja comunicada ao aluno o mais rápido possível e com calma, para que a informação possa ser assimilada e para que o aluno possa saber o que esperar do restante daquele dia. Evitar surpresas e mudanças de planos é sempre uma boa ideia.
Outro aspecto a ser levado em consideração para que a inclusão do aluno com autismo possa ocorrer de forma adequada na escola é a abordagem e as estratégias utilizadas pelos professores. A promoção de trabalhos em grupo dentro de sala de aula, por exemplo, é um bom jeito de incentivar a socialização dos alunos com autismo junto aos alunos neurotípicos, dando a eles a oportunidade de interação em um ambiente controlado pelo professor e já conhecido pelos alunos, onde intervenções podem ser feitas, se necessário. Dessa maneira, evita-se que o aluno com autismo tenha sempre que trabalhar sozinho e sob supervisão, evitando o distanciamento entre esse aluno e os demais colegas de turma.
Uma ideia inclusiva é utilizar o próprio hiperfoco possivelmente apresentado como sintoma pelo aluno com autismo como estratégia na produção de material autêntico para as aulas da disciplina dada pelo professor. O hiperfoco, como muitos sabem, é um dos sintomas do TEA – Transtorno do Espectro Austista – e consiste, basicamente, em uma forma intensa de concentração em um mesmo assunto, tópico ou tarefa pela pessoa com autismo. Por isso, buscar incluir o tópico do hiperfoco do aluno com autismo na explicação do conteúdo dado pelo professor pode ser uma estratégia interessante, pois acarreta num maior interesse por parte do aluno que, em outras ocasiões, poderia apresentar dificuldade de concentração na aula.
Além disso, por vezes, é interessante que a própria escola ofereça um curso complementar sobre inclusão para seu corpo docente, assim, todos recebem um conhecimento específico sobre o assunto e passam a se sentir mais confiantes para atuar em salas de aula com alunos com alguma deficiência.
Giovanna Naddeo
Escritora, professora e tradutora formada em Letras pela UNICAMP. Apaixonada por viagens, bordados e animais. Acredita que um mundo melhor se faz com pessoas que se incentivam.
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